MST envia jovens de assentamentos para cursar medicina na Venezuela

“Os jovens foram contemplados num convênio que é fruto da solidariedade internacional entre Cuba-Venezuela-MST. O acordo que prevê o intercâmbio entre o governo desses países e o MST, tem como objetivo desenvolver projetos e ações com a finalidade de beneficiar as comunidades rurais e urbanas”

Na semana passada o vereador professor Gilmar Santos (PT) encontrou com quatro jovens estudantes do MST da nossa região que embarcavam com destino à Venezuela para cursar medicina.

Os jovens foram contemplados num convênio que é fruto da solidariedade internacional entre Cuba-Venezuela-MST. O acordo que prevê o intercâmbio entre o governo desses países e o MST, tem como objetivo desenvolver projetos e ações com a finalidade de beneficiar as comunidades rurais e urbanas.

Reginaldo Martins, que faz parte da coordenação estadual do MST disse que essa parceria já existe há pelo menos 10 anos e que estudantes de outros acampamentos ligados ao movimento também estarão embarcando para a Venezuela. Ao todo, são 30 jovens brasileiros, destes, 10 do estado do Pernambuco.

“Essa parceria já existe há muito tempo com Cuba e nos últimos 10 anos com a Venezuela, tendo em vista também que os professores são todos cubanos. É uma parceria que os movimentos sociais da via campesina do Brasil envia jovens para poder ter essa oportunidade (…) Nós já formamos outras turmas de agroecologia e agora nós estamos enviando 30 jovens dos assentamentos da reforma agrária ligados ao MST para poder cursar medicina porque a gente acha que é muito importante, pois, eles serão os médicos que vão cuidar da vida das pessoas que moram no campo”.

Um dos jovens que vai participar do intercâmbio é filho de Reginaldo, e para ele essa é uma oportunidade única, tendo em vista as novas propostas do presidente da república Jair Bolsonaro.

“A gente não sabe se daqui uns 10 ou 20 anos um filho de agricultor sem-terra, de assentamento de reforma agrária vai ter a oportunidade de fazer uma faculdade… Porque a ideia do governo Bolsonaro é de privatizar; então quando privatiza tem que ter dinheiro para poder cursar” indagou.

Para o estudante Eubli Pimentão Costa, de 21 anos, esse processo é o resultado da luta dos movimentos sociais e que esse é o momento de disfrutar dessas conquistas.

“Pra mim é um privilégio estar passando por esse processo, que na verdade é fruto de muita luta dos movimentos sociais lá da Venezuela, de Cuba, do governo de Chávez, e agora a gente poder desfrutar dessas lutas deles.  Para mim, é uma honra imensa estar saindo do meu país Brasil para me formar em medicina e futuramente voltar aqui atuando e ajudando quem me deu impulso, quem me deu oportunidade de dar um passo a mais na minha vida” disse.

Juliana leite da silva, de 19 anos, que também é estudante, disse que está muito feliz com o intercâmbio, pois, acredita que não teria essa mesma oportunidade no Brasil.

“Em termos de aprendizado acho que lá é melhor do que aqui no brasil. Aqui é muito difícil poder ter uma oportunidade dessas porque tem o ENEM, só que o ENEM tanto aprova eu que sou da classe trabalhadora quanto aprova a burguesia, que é maioria nas universidades; e para essas pessoas a classe trabalhadora não tem direito de fazer faculdade” Concluiu.

Além de Eubli e Juliana, embarcaram também Danilo de Araújo e Edean Martins. Os jovens são moradores dos seguintes assentamos: São José do Vale, em Petrolina; José Almeida, em Lagoa Grande; e Catalunha, em Santa Maria da Boa Vista.

 

 

 

Ditadura nunca mais: Vereador professor Gilmar Santos (PT) solicita Moção de Repúdio contra o presidente da República Jair Bolsonaro

“O requerimento surge após Bolsonaro ter determinado ao Ministério da Defesa que fizesse as “comemorações devidas” pelos 55 anos do início da ditadura militar no Brasil”

Gilmar Santos | Foto: Camila Rodrigues

Otávio Rêgo Barros, porta-voz da Presidência da República, afirmou nesta segunda-feira (25) que o presidente Jair Bolsonaro determinou ao Ministério da Defesa que faça as “comemorações devidas” pelos 55 anos do golpe que deu início à ditadura militar no Brasil. De acordo com Rêgo, “o presidente não considera o 31 de março de 1964 golpe militar”.

Durante a Sessão Plenária desta quinta-feira (28), o vereador professor Gilmar Santos (PT) apresentou na Casa Plínio Amorim um requerimento oral que solicita moção de repúdio ao presidente por essa atitude.

De acordo com Gilmar, “A Constituição Federal em seu art. 5, inc. XLIV, proíbe qualquer tipo de propaganda, de apologia à Ditadura ou situações que violem os direitos humanos, pois atentam contra a ordem constitucional e o Estado Democrático”. Para ele, é inadmissível termos um representante que solicita a comemoração de um regime que rompeu com ardem democrática e que violou os direitos humanos da população através de torturas, assassinatos, censura, entre outras atrocidades.

“Não é à toa que nós estamos aqui apresentando essa moção de repúdio, não é à toa que nós estamos indignados. Primeiro que o presidente, segundo o artigo 85 da Constituição Federal, ao solicitar a comemoração de uma ditadura militar está incorrendo em crime de responsabilidade” disse.

Na oportunidade, o parlamentar chamou o presidente de irresponsável e leu uma parte de um inventário da violência da ditadura que apresenta a quantidade de torturas, de desaparecidos, de exilados e mortos pela repressão do regime.

“Nós precisamos da democracia, do aperfeiçoamento da democracia e não de ditadura (…) violência só nos atrasa. Fica registrado aqui esse nosso repúdio, e queremos dizer que DITADURA NUNCA MAIS, para que não se esqueça, para que nunca mais aconteça” concluiu.

Na última terça-feira (26) a Defensoria Pública da União e o Ministério Público Federal questionaram a ordem do presidente e apontaram a medida como violação dos princípios constitucionais e que pode configurar ato de improbidade administrativa.

Segundo a DPU, a ordem de Bolsonaro é ilegal, pois, conforme a Lei 12.345/2010 a instituição de datas comemorativas que vigorem em todo território nacional deve ser objeto de projeto de lei. Além disso, ressalta que essa atitude fere o direito à democracia, bem como estimula novos golpes.

Por meio da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC), O MPF afirma em nota que “festejar um golpe de Estado e um regime que adotou políticas de violações sistemáticas aos direitos humanos e cometeu crimes internacionais” é “incompatível com o Estado Democrático de Direito”.

Ainda segundo o MPF, o apoio de Bolsonaro a um golpe militar constitui crime de responsabilidade, segundo o artigo 85 da Constituição, e a Lei 1.079, de 1950, e que pode motivar a abertura de processo de impeachment.

 

Fonte: CONJUR

Clique para saber mais sobre o que foi a Ditadura Militar no Brasil.

 

***Inventário da violência praticada durante a ditadura cívico-militar-empresarial desde 1.4.1964: 55 anos de dor, amnésia, injustiça e sofrimentos de todo o povo brasileiro:

500.000 cidadãos investigados pelos órgãos de segurança
200.000 detidos por suspeita de subversão
50.000 presos entre março e agosto de 1964
11.000 acusados em julgamentos viciados de auditorias militares
5.000 condenados
10.000 torturados no DOI-CODI de São Paulo
40 crianças presas e torturadas no DOI-CODI paulistano
8.300 vítimas indígenas de dezenas de etnias e nações
1.196 vítimas entre os camponeses
6.000 mil apelações ao STM que manteve as condenações destes 2.000 casos
10.000 brasileiros exilados
4.882 mandatos cassados
1.148 funcionários públicos aposentados ou demitidos
1.312 militares reformados compulsoriamente
1.202 sindicatos sob intervenção do Estado e do Judiciário cúmplice e
inconstitucional
248 estudantes expulsos de universidades pelo famigerado decreto
ditatorial numero 477
128 brasileiros e 2 estrangeiros banidos sendo alguns sacerdotes
católicos …
4 condenados à morte (pena comutada para prisão perpetua)
707 processos políticos instaurados pela Justiça militar em diversas
Auditorias
49 juízes expurgados, três deles do Supremo Tribunal Federal
3 vezes em que o Congresso Nacional foi fechado pelos generais ditadores
7 Assembleias Legislativas postas em recesso
Censura prévia a toda a imprensa brasileira
434 mortos pela repressão
144 desaparecidos
126 militares, policiais e civis mortos em ações contra a resistência
à ditadura
100 empreiteiras e bancos envolvidos em escândalos abafados pelos militares
Reimplantação do trabalho escravo nas fazendas do Brasil com o
beneplácito dos governos militares.
Sucateamento das Universidades pela imposição do programa MEC-USAID
Destruição do movimento social brasileiro
Fim das organizações da sociedade civil como UNE, Centros de Cultura,
Ligas Camponesas, JUC, Agrupamentos e partidos de esquerda.
Corrupção em todos os níveis por grupos militares e cobrança de
propinas para as grandes obras.
Submissão aos interesses norte-americanos pela presença da CIA e de
torturadores treinados na Escola das Américas em todos os órgãos
policiais e militares.
Destruição das Guardas municipais e estaduais e militarização das policias
Domínio da Lei de Segurança Nacional e propaganda da Ideologia de
Segurança Nacional.
Expansão do poder de empresas beneficiarias do golpe como redes de TV,
jornais pro-ditadura e grupos econômicos que financiaram a tortura
e a repressão.
21 anos de ditadura e escuridão com a destruição das vias democráticas
e o vilipêndio da Constituição e da Liberdade em nome do Estado
autocrático e destrutivo da nação brasileira.
Construção de obras faraônicos como Transamazonica, Ponte rio-Niteroi,
Itaipu e outras com desvio de vultosas quantias do erário publico
para empresas e corruptos do governo federal e estadual.
Instauração de senadores e prefeitos biônicos.
Criação de locais de tortura e casas da morte, como por exemplo, a de
Petrópolis-RJ.
Instalação de campos de concentração em território nacional usando de
técnicas nazistas.
Pagamento e manutenção de imensa rede de arapongas e informantes das
forças repressivas para denunciar os que lutavam pela democracia.
Apoio de médicos para a realização da tortura e para fazer laudos
falsos das mortes em prisões e locais do Estado brasileiro.
Perseguição e morte de brasileiros fora do Brasil em ligação com as
forças ditatoriais de outros países do Cone Sul.
Acolhida de ditadores de outros países como Alfredo Stroessner do Paraguai.
Financiamento de grupos paramilitares.
Apoio a atos terroristas e incêndio de prédios (UNE), bancas de
jornais, redações, igrejas, sindicatos, e apoio às milícias de
latifundiários para extermínio sistemático e impune de índios e
posseiros em toda a Amazônia e Nordeste brasileiro.
Campanha de difamação contra bispos, pastores, líderes políticos em
canais de televisão para indispor a opinião pública e favorecer a
repressão.
Proibição de citar o nome de Dom Helder Câmara em qualquer órgão de
imprensa do Brasil por mais de 20 anos, quer notas positivas quer
negativas.
Bombas explodidas em todo o território nacional e em particular no
episódio do RioCentro a mando de generais e grupos terroristas dentro
das Forças Armadas.
Perseguição aos artistas brasileiros.
Formação da ARENA, partido de direita manipulado pelos militares e
elite financeira do Brasil.
Repressão e perseguição da UNE e invasão da PUC-SP pelo coronel Erasmo Dias

Concentração de terras e agrotóxicos: as faces do Brasil ruralista

Censo Agro de 2017 deixou apenas uma pergunta sobre agrotóxicos

Novo censo teve cortes de gastos que impactaram a pesquisa e o cronograma. / Camille Perissé

O IBGE divulgou, em fins de julho, a primeira prévia dos resultados do Censo Agropecuário de 2017, agora apelidado de Censo Agro. Umas das principais manchetes nas divulgações se referiam à questão dos agrotóxicos. O próprio release do IBGE afirma: “Uso de agrotóxicos aumenta 20,4% em 11 anos”.

É necessário, no entanto, olhar com um pouco mais de profundidade sobre estes dados para entender melhor seu significado e suas consequências.

Para iniciar a análise de qualquer fonte de dados, é fundamental fazermos algumas perguntas básicas: quem produziu os dados, como foram produzidos e com qual objetivo. Neste sentido, é importante resgatar rapidamente o histórico do Censo de Agropecuário de 2006 até aqui.

O Censo de Agropecuário de 2006 foi um marco na história da agricultura do Brasil. A partir de um amplo processo de diálogo com a sociedade, formulou-se um questionário que atendeu diversas demandas de conhecimento da realidade rural. A principal delas foi a caracterização da agricultura familiar no Brasil.

A partir deste Censo revelou-se que 70% da alimentação que chega à mesa da sociedade vem justamente dos sítios menores do que 4 módulos fiscais, com trabalho majoritariamente realizado por familiares. Esta informação foi elaborada com base nos dados do Censo Agropecuário de 2006, que mostrou a produção da agricultura familiar, e nos dados da Pesquisa de Orçamento Familiar de 2009, também do IBGE, que mostra o perfil do consumo de alimentos no país.

Produzido de forma completamente objetiva e embasada, este indicador provocou a ira do agronegócio. Um de seus representantes afirmou recentemente em artigo que esta informação é “um discurso político e não um estudo técnico”. Se um indicador retirado de duas pesquisas nacionais feitas pelo IBGE não é um estudo técnico, fica difícil entender então o que de fato é.

O Censo de 2006 trouxe cinco perguntas referentes ao uso de agrotóxicos em cada propriedade:

Uso de agrotóxicos: Sim, Não, Não precisou usar no ano de referência;

Tipo de equipamento de aplicação utilizado: Pulverizador costal, Pulverizador estacionário, Equipamento de tração mecânica e/ou animal, Por aeronave, Outro modo;

Destino das embalagens: Vendidas, Largadas no campo, Reaproveitadas, Depósito de lixo comum, Queimadas ou enterradas, Devolvidas ao comerciante, Recolhidas pela prefeitura ou órgãos públicos ou entregue à central de coleta de embalagens, Depositadas no estabelecimento, aguardando para serem retiradas, Outro destino;

Uso de equipamentos de proteção: Chapéu ou capuz, Óculos ou protetor facial, Máscara, Roupa protetora (macacão), Avental ou capa, Luvas, Botas, Trator ou veículo utilizado com cabine protetora, Não utiliza;

Existência de pessoas intoxicadas: Não, Sim, Não sabe.

A análise destes dados permitiu observar que, apesar de os grandes proprietários de terra serem os maiores utilizadores de agrotóxicos, os pequenos são os mais prejudicados. Entre as propriedades com menos de 100 ha, 21% declarou não usar equipamentos de proteção. Já entre as fazendas com mais de 100 ha, apenas 3,5% declarou não se proteger ao aplicar venenos.

O mesmo se observa quanto à devolução de embalagens. Enquanto entre os pequenos apenas 47% devolve ou tem embalagens recolhidas, o mesmo número sobe para 84% considerando-se os grande proprietários.

Já em relação ao método de aplicação, novamente os pequenos ficam em desvantagem: 66% dos pequenos agricultores que usam agrotóxicos fazem aplicação utilizando bomba costal, método que deixa o trabalhador mais exposto aos venenos. Entre os grandes, o número é de apenas 15%. Importante ressaltar que 10% dos grandes proprietários utilizam pulverização aérea, uma espécie de arma química que polui tudo à sua volta: ar, água, solo e principalmente comunidades, incluindo escolas rurais.

Em termos de intoxicações declaradas, os valores não diferem muito: 1,1% dos pequenos afirmou haver pessoas intoxicadas, enquanto entre os grandes o número foi de 1,7%. No entanto, se mesmo profissionais de saúde têm dificuldades em identificar intoxicações por agrotóxicos, o quadro se agrava quando um recenseador pergunta diretamente ao responsável por uma propriedade rural.

Infelizmente, estes dados não poderão ser verificados novamente no Censo de 2017.

Previsto para ser iniciado em 2016, o novo Censo teve cortes de gastos que impactaram a pesquisa e o cronograma. O questionário foi reduzido e houve forte interferência da bancada ruralista. A pesquisa, inclusive, foi viabilizada por uma emenda parlamentar da Senadora Ana Amélia (PP-RS), ruralista de carteirinha e agora vice do candidato à presidência Geraldo Alckmin. E, como sabemos, quem paga a banda, escolhe a música. Para mais detalhes, uma excelente reportagem foi escrita pela jornalista da Fiocruz Cátia Guimarães.

Entre os inúmeros cortes, o Censo Agro de 2017 deixou apenas a primeira pergunta sobre agrotóxicos. Todas as outras, referentes à equipamentos de aplicação, proteção, intoxicações e destino das embalagens foram cortadas.

A afirmação do próprio IBGE de que o “Uso de agrotóxicos aumenta 20,4% em 11 anos” pode ser considerada, no mínimo, imprecisa. O que aumentou de fato foi o número de propriedades que usam agrotóxicos. E porque é impreciso afirmar que “o uso de agrotóxicos” aumentou? Porque nestes dados não se considera o tamanho das propriedades. Ponderando ainda que a concentração de terras aumentou, a relação entre número de propriedade e área que elas ocupam fica ainda mais distante.

Um exemplo hipotético: se tivéssemos 9 propriedades de 1 ha sem uso de agrotóxicos, e uma de 100 ha com uso de agrotóxicos, teríamos 90% das propriedades livres de venenos (uau!). No entanto, em termos de área, teríamos apenas 9 ha sem agrotóxicos e 100 ha com agrotóxicos, o que explica muito melhor a exposição da população à contaminação por agrotóxicos.

No Censo de 2006, apenas 33% das propriedades com menos de 100 ha usou agrotóxicos. Nas maiores de 100 ha, o percentual quase dobra: 62%. Considerando apenas os grandes latifúndios, o valor sobre para 72%. Ou seja: os grandes proprietários são os maiores responsáveis pelo uso de agrotóxicos no Brasil.

É preciso aguardar a liberação dos dados do Censo Agropecuário de 2017 estratificados por tamanho de propriedades para termos uma ideia mais clara de como ocorreu o aumento no uso de agrotóxicos no campo.

Mas, tendo em vista que o número de propriedades usando agrotóxicos aumentou muito – 20% – e a concentração de terras também, é bem provável que o padrão de 2006 seja mantido: grandes propriedades utilizando muito mais do que as pequenas.

Infelizmente, muita informação foi perdida com os cortes ruralistas. Mesmo assim, duas incômodas verdades não conseguiram ser abafadas: a tragédia da concentração de terras no Brasil segue intocada (desde 1500, diga-se de passagem) e a tragédia dos agrotóxicos segue indissociável da primeira.

Por Alan Tygel

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Na ONU, Brasil mascara realidade de violência contra povos indígenas

Cimi denunciou os assassinatos dos professores Marcondes Namblá Xokleng e Daniel Kabinxana Tapirapé, a queima da base de proteção na terra indígena Karipuna e a violência da PM contra famílias Kaingang. Brasil rebateu e afirmou que direitos indígenas são respeitados no país.

Manifestação durante Acampamento Terra Livre de 2017. Foto: Guilherme Cavalli/Cimi

POR GUILHERME CAVALLI, ASCOM CIMI

A violenta conjuntura enfrentada pelos povos indígenas no Brasil foi denunciada na terça-feira (14) durante a 37º sessão regular do Conselho de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU), em Genebra, Suíça. Os casos de violações e a ineficácia do Estado na execução de políticas públicas junto as comunidades tradicionais foram apresentados na mesa que debate a situação de direitos humanos que exigem a atenção do Conselho. Ao classificar a denúncia como “alegações incompletas e enganosas”, Brasil rebateu e afirmou que direitos indígenas são respeitados no país. 

Entre os temas levados à instância internacional pelo representante do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), destacou-se os assassinatos dos professores Marcondes Namblá Xokleng e Daniel Kabinxana Tapirapé, nos estados de Santa Catarina e Mato Grosso, no mês de janeiro; a queima da base de proteção na terra indígena Karipuna, em Rondônia; e o despejo extrajudicial, com práticas de tortura, contra famílias do povo Kaingang, pela polícia militar do Rio Grande do Sul, em fevereiro.

Os fatos “dão mostras inequívocas de que o patamar de violências e violações contra os povos, seus membros e seus direitos, alcançou um nível de envergadura insuportável no país”, descreve o texto. O Cimi chamou atenção ainda para medidas do Executivas brasileiro que “potencializado exponencialmente os perigos a que os povos [indígenas] estão submetidos”. O estrangulamento orçamentário da Fundação Nacional do Índio (Funai), a criação do Parecer Anti-Demarcação da Advocacia Geral da União e a tese inconstitucional do Marco Temporal foram expostas como “ações que exercem permanente pressão sobre os povos e seus direitos no Brasil”.

“Nesse cenário, os riscos da prática de despejos extrajudiciais contra comunidades indígenas e da ocorrência de genocídios e etnocídios estão fortemente colocados. Massacres de grupos isolados já tem sido denunciados e novos casos são potencialmente iminentes”.

“A estratégia anti-indígena em curso tem provocado uma espiral de violações que chega, neste ano de 2018, numa fase onde a barbárie contra os povos é praticada sem remorsos por “indivíduos comuns” e por forças armadas do próprio Estado”, declarou em artigo Cleber Buzatto, secretário-executivo do Cimi. “Temos alertado, insistentemente, acerca da existência e implementação de uma estratégia anti-indígena no país por parte de setores do Capital, nacional e transnacional, que atuam no campo brasileiro, que se beneficiam e fortalecem, cada vez mais, o modelo do agronegócio Brasil afora”.

Governo e argumentos frágeis

Em réplica a denúncia, Estado brasileiro diz assumir “longo compromisso com a promoção e a proteção dos direitos dos povos indígenas”. A afirmação da representação brasileira na ONU ocorreu na mesma semana em que o país foi condenado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) por violar direitos indígenas. Em decisão histórica, CIDH reconhece que Estado brasileiro atuou de forma lenta e inadequada na demarcação da terra do povo Xukuru, em Pernambuco.

A quase total paralisação dos procedimentos demarcatórios de terras indígenas e quilombolas durante governo Temer foi rebatido pelo Brasil ao apontar o reconhecimento da terra indígena Jurubaxi-Téa, no Amazonas. Contudo, são 836 terras indígenas com pendências administrativas para terem seus procedimentos demarcatórios finalizados. Desses, 530 terras indígenas sem nenhuma providência para demarcação. Além da paralisação, Estado brasileiro, atua para rever e até revogar procedimentos assinados por presidentes anteriores, como ocorreu na anulação da portaria declaratória que demarcou a Terra Indígena Jaraguá, em São Paulo.

“Não é novidade para ninguém que trabalhamos com o segundo menor orçamento da história da Funai”

Na semana passada, em reunião com lideranças indígenas Karipuna, Franklimberg Ribeiro de Freitas afirmou “ser do conhecimento de todos os cortes orçamentários na Funai”. “Não é novidade para ninguém que trabalhamos com o segundo menor orçamento da história da Funai”, advertiu o general que está à frente do órgão indigenista do governo Temer. Contudo, na ONU, ao contrário do que garantiu o presidente da instituição, Brasil garante que “Funai permanece totalmente comprometida para garantir os direitos dos povos indígenas do Brasil”.

“A reação da representação do governo brasileiro no Conselho de Direitos Humanos da ONU, diante das denúncias apresentadas pelo Cimi, consiste numa desesperada e frustrada tentativa de ‘encobrir o sol com a peneira’”, sustenta Cleber Buzatto.

“O Cimi reafirma as denúncias feitas, pois as mesmas se sustentam na dura realidade enfrentada pelos povos indígenas no Brasil”.

Outras denúncias

Na mesa que debateu sobre os direitos da criança, no dia 5 de fevereiro, também pertencente a 37º sessão regular do Conselho de Direitos Humanos da ONU, a carta lida por representante do Cimi evidenciou a situação dramática das crianças indígenas, violentadas por políticas genocidas que as retiram do convívio de suas famílias. “Contra os Guarani Kaiowá, observa-se uma dupla violação, uma vez que sob o argumento da indigência, crianças indígenas têm sido retiradas forçosamente de seus pais e colocadas em abrigos públicos. As crianças indígenas representam 60% das crianças internadas”, noticiou o Cimi.

Segundo Aty Guasu, organização do povo, a forma como são feitas as intervenções pelos “órgãos de proteção” desrespeita o modo de vida física e cultural do povo Guarani e Kaiowá, e são fundamentadas em “conceitos e interpretações racistas, preconceituosas, primárias, ignorantes à diversidade dos povos indígenas”.

Em maio de 2017, durante a Revisão Periódica Universal (RPU), encontro que analisa a atuação do Estado frente as políticas ligadas a Direitos Humanos, 29 países mostraram-se preocupados com as políticas anti-indígenas assumidas pelo Governo brasileiro. A ineficiência do Estado junto aos povos indígenas esteve entre os temas mais apontados na sabatina. Ações do Governo Federal que dificultam a promoção da vida dos indígenas, como desmonte da FUNAI, morosidade na garantia do direito constitucional a terra, violência aos povos indígenas, ausência de proteção a defensores de direitos humanos, foram os temas mais citados nas considerações ao Brasil.

As denúncias levadas à Genebra buscam o monitoramento dos organismos multilaterais de direitos humanos, em especial do CDH da ONU, sobre a situação de violações a que os povos indígenas estão submetidos.

 

Brasília, Genebra
14 de março 2018.

 

Conselho de direitos humanos
37º Sessão regular do Conselho de Direitos Humanos
26 fevereiro a 23 março

Texto da denúncia abaixo:

Item 4: Situação de Direitos Humanos que exigem a atenção do Conselho
 – Debate Geral –

O ano 2018 apresenta-se como extremamente perigoso e desafiador para os povos indígenas no Brasil. Os assassinatos dos professores Marcondes Namblá Xokleng, a pauladas, e Daniel Kabinxana Tapirapé, apedrejado, nos estados de Santa Catarina e Mato Grosso, respectivamente, no mês de janeiro;  a queima da base de proteção na terra indígena Karipuna, em Rondônia;  o despejo extrajudicial, com práticas de tortura, contra famílias do povo Kaingang, pela polícia militar do Rio Grande do Sul, em fevereiro; dão mostras inequívocas de que o patamar de violências e violações contra os povos, seus membros e seus direitos, alcançou um nível de envergadura insuportável no país.

O perigo a que os povos estão submetidos é potencializado exponencialmente por iniciativas de Poderes do Estado brasileiro. O Parecer Anti-demarcação 001/17 da Advocacia Geral da União/Temer; a paralização dos procedimentos de demarcação das terras indígenas; o estrangulamento orçamentário e a instrumentalização política da Fundação Nacional do Índio (Funai) aos interesses do fundamentalismo religioso e do agronegócio; a Proposta de Emenda Parlamentar (PEC) 215/00; a tentativa de legalizar a invasão e a exploração externa das terras indígenas; as reintegrações de posse; a negativa do acesso à justiça e a sombra do Marco Temporal são ações que exercem permanente pressão sobre os povos e seus direitos no Brasil.

Nesse cenário, os riscos da prática de despejos extrajudiciais contra comunidades indígenas e da ocorrência de genocídios e etnocídios estão fortemente colocados. Massacres de grupos isolados já tem sido denunciados e novos casos são potencialmente iminentes.

Consideramos de fundamental importância o permanente monitoramento e a emissão de posicionamentos direcionados por parte de organismos multilaterais de direitos humanos, de modo especial do Conselho de Direitos Humanos da ONU, acerca dessa situação de violações a que os povos originários estão submetidos no Brasil.

Muito obrigado.

Conselho Indigenista Missionário – Cimi

 

fonte:https://www.cimi.org.br/2018/03/na-onu-brasil-mascara-realidade-de-violencia-contra-povos-indigenas/