O conteúdo, divulgado pelo The Intercept Brasil, revela trama para impedir vitória do PT nas eleições, assim como interferências de Moro no Ministério Público para acusar Lula
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A agência de notícias The Intercept Brasil divulgou neste domingo, 09 de junho, três reportagens polêmicas que revelam “discussões internas e atitudes altamente controversas, politizadas e legalmente duvidosas da força-tarefa da Lava Jato” entre o procurador que coordenou as investigações, Deltan Dallagnol, e o atual ministro da justiça, Sergio Moro.
Segundo o Intercept, as três matérias, que são apenas o começo de uma grande investigação jornalística, foram produzidas a partir de “arquivos enormes e inéditos – incluindo mensagens privadas, gravações em áudio, vídeos, fotos, documentos judiciais e outros itens – enviados por uma fonte anônima”.
Além de revelarem comportamentos antiéticos e transgressões dos envolvidos, as reportagens explicam algumas consequências das ações da Lava Jato como, por exemplo, a prisão do ex-presidente Lula que “uma vez sentenciado por Sergio Moro, teve sua condenação rapidamente confirmada em segunda instância, o tornando inelegível no momento em que todas as pesquisas mostravam que liderava a corrida eleitoral de 2018”, o que escancara o jogo de interesses políticos: Moro frauda o sistema de justiça para condenar Lula e manipular eleição abrindo caminhos para a eleição de Bolsonaro, que logo nomeou o então juiz Sergio Moro, Ministro da Justiça.
Entre outros elementos, as reportagens
revelam o desejo dos procuradores da Lava Jato em impedir a eleição do PT, bem
como suas ações para atingir esse objetivo; e as interferências secretas e antiéticas
de Moro ao Ministério Público para acusar Lula, ferindo o principio de imparcialidade
previsto na Constituição e no Código de Ética da Magistratura.
Em nota, Moro disse que “lamenta-se a falta de indicação de fonte de pessoa responsável pela invasão criminosa de celulares de procuradores”. O que o ministro esqueceu foi que em 2016 ele mesmo se pronunciou dizendo “a democracia em uma sociedade livre exige que os governados saibam o que fazem os governantes, mesmo quando estes buscam agir protegidos pelas sombras” ao vazar ilegalmente grampo dos ex-presidentes Lula e Dilma.
O
Intercept afirmou que não procurou os envolvidos antes das publicações
“para evitar que eles atuassem para impedir sua publicação e porque os
documentos falam por si”. Além disso, em matéria a agência disse
que “Nós tomamos medidas para garantir a
segurança deste acervo fora do Brasil, para que vários jornalistas possam
acessá-lo, assegurando que nenhuma autoridade de qualquer país tenha a
capacidade de impedir a publicação dessas informações”.
As máscaras dos “defensores da justiça”, “heróis anticorrupção” começam a cair, deixando às vistas da população brasileira as teias de reais interesses que fundamentam o plano do (des) governo Bolsonaro- que vem legislando em causa própria. Segundo o Intercept, esse é apenas um começo do que se pretende tornar uma investigação jornalística contínua das ações de Moro, de Dallagnol e da força-tarefa da Lava Jato.
Leia matérias na íntegra:
Parte 1: Como e porque o Intercept está pulicando chats privados sobre Lava Jato e Sergio Moro
Parte 2: Procuradores da Lava Jato tramaram em segredo para impedir entrevista de Lula antes das eleições por medo de que ajudasse a “eleger o Haddad”
Parte 3: Deltan Dallagnol duvidava das provas contra Lula e de proprina da Petrobras horas antes da denúncia do triplex
Líder religioso se solidariza pelas “duras provas” pela qual Lula tem passado; leia mensagem na íntegra
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O Papa Francisco, autoridade máxima da Igreja Católica, enviou neste mês uma carta ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. No documento, em resposta à uma carta de Lula enviada em 29 de março, o pontífice se solidariza com ex-presidente, que, segundo ele, tem passado por “duras provas” com a morte de sua esposa, Marisa Letícia, de seu irmão, Genival Inácio, e de seu neto, Arthur.
“A sua Páscoa, sua passagem da morte à vida, é também a nossa páscoa: graças a Ele, podemos passar da escuridão para a Luz; das escravidões deste mundo para a liberdade da Terra prometida; do pecado que nos separa de Deus e dos irmãos para a amizade que nos une a Ele; da incredulidade e do desespero para a alegria serena e profunda de quem acredita que, no final, o bem vencerá o mal, a verdade vencerá a mentira e a Salvação vencerá a condenação”, diz a missiva.
O líder religioso também lhe deseja ânimo e confiança em Deus, além de pedir que Lula siga rezando por ele e diz que acredita, assim como seus antecessores, que “a política pode se tornar uma forma eminente de caridade se for implementada no respeito fundamental pela vida, a liberdade e a dignidade das pessoas”.
Críticas ao governo Bolsonaro feitas pelo ex-presidente em Curitiba foram reproduzidas em dezenas de países
Lula falou por quase duas horas aos jornalistas Florestan Fernandes Jr. e Mônica Bergamo / Ricardo Stuckert
A primeira entrevista do ex-presidente Lula (PT) desde a prisão política foi concedida na última sexta-feira (26), e o assunto ganhou as páginas dos principais jornais do mundo durante o final de semana. A entrevista à Folha de S. Paulo e ao jornal El País Brasilfoi repleta de críticas ao governo Bolsonaro (PSL) e repercutiu em países como Argentina, França, Itália, Inglaterra, Rússia, Portugal, Espanha e Estados Unidos.
Apesar da notoriedade internacional, as emissoras brasileiras Globo e Record ignoraram a entrevista em seus jornais noturnos de sexta-feira.
A declaração de que o Brasil “está sendo governado por um bando de malucos” foi a que mais teve destaque fora do país. A agência de notícias italiana Ansa ressaltou ainda o momento em que Lula diz que o Brasil atingiu “o nível mais baixo da política externa que vimos”.
Nos Estados Unidos, The New York Times chamou a atenção para as menções de Lula ao ministro Sérgio Moro: “Estou obcecado em desmascarar o juiz Moro e aqueles que me sentenciaram. Quero expor a farsa montada no Departamento de Justiça dos Estados Unidos”, disse o ex-presidente.
O inglês The Guardian destacou a indignação do petista com o apreço de Bolsonaro pelos Estados Unidos: “Você deve amar sua mãe, você deve amar o seu país. O que é isso de amar os Estados Unidos? Alguém acha mesmo que os Estados Unidos vão favorecer o Brasil?”, repercutiu o jornal.
Na América Latina, a venezuelana Telesur e o argentino Página 12também destacaram trechos em que Lula desabafou sobre o governo de Bolsonaro: “Vamos fazer uma autocrítica geral nesse país. O que não pode é o Brasil estar governado por esse bando de malucos. O país não merece isso e sobretudo o povo não merece isso”, ressaltou o petista.
A entrevista atingiu a maior audiência da plataforma on-line do jornal espanhol El País em todo o mundo e ganhou destaque na primeira página da versão espanhola com o trecho “Posso seguir preso por 100 anos, mas não trocarei minha dignidade pela minha liberdade”.
“Saiba que você está em meus pensamentos e que a injustiça que se passa na carceragem da Polícia Federal de Curitiba é percebida por milhões aqui fora, sem contar internacionalmente, onde sua prisão é tida como um dos grandes absurdos políticos em curso”
Foto: Christian Parente)
Estimado Presidente Lula,
Expresso nesta carta minha profunda solidariedade frente às injustas condenações e perseguições judiciais sofridas por você e sua família. Acompanho desde o início a farsa jurídica posta em curso para legitimar o antipetismo, a deterioração de empresas nacionais e a alteração no curso eleitoral brasileiro, farsa cada vez mais escancarada agora com o juiz como ministro da justiça do candidato favorecido pelo seu afastamento na disputa.
Não o conheço para além de um cumprimento uma única vez na quadra do Sindicato dos Bancários em São Paulo, em 2016, bem como, embora tenha sido Secretária Adjunta de Direitos Humanos na gestão de Fernando Haddad, não faço parte de partido político. Nem por isso, deixo de admirar as conquistas de seus mandatos para o país; pelo contrário, sou de família de trabalhadores que o apoiaram desde minha infância.
Meu pai, Joaquim Ribeiro dos Santos, estivador do porto de Santos, uma semana antes de falecer no hospital da cidade, folheava o jornal que trazia sua foto como Presidente da República. Havia acabado de acontecer aquele dia apoteótico em Brasília, que tanto encheu as pessoas de esperanças. Olhando a foto, com os olhos marejados, Seu Joaquim disse “vivi para ver um trabalhador ser Presidente”. Sua eleição foi um último presente antes da morte de meu pai.
Naquela época tinha 22 anos, mais à frente ia ser mãe, a vida me traria tantos outros desafios até que me vi com 27 anos e inquieta para fazer uma Faculdade e ter uma carreira diferente daquela que vivia como secretária numa empresa no Porto de Santos. Fui então ao vestibular e passei em Filosofia na Universidade Federal de São Paulo, no campus do Bairro dos Pimentas, criado durante sua gestão. Fui uma adolescente negra nos anos 90, sabia da falta de perspectiva que havia para pessoas como eu, e as mudanças promovidas pelo seu governo possibilitaram uma outra realidade para mim e para tantas pessoas. Saí em 2015, mestra em Filosofia Política, e desde então tenho me saído muito bem. Oportunidades mudam vidas.
Por isso, embora tenha ficado brava com você algumas vezes, não deixo jamais de reconhecer a importância do seu governo para pessoas do meu grupo social, sendo eu mesma um exemplo disso. Reverencio as mulheres negras que fizeram parte decisiva de políticas públicas para as pessoas negras, como a grande Luiza Bairros, Matilde Ribeiro, Nilma Lino Gomes, na certeza de que será apenas quando o campo progressista entender a pauta racial para além de um ministério que haverá maturidade suficiente para entender os novos tempos e o povo brasileiro.
Como feminista negra, me alio a Joice Berth, Juliana Borges, Carla Akotirene, as mais velhas e mais novas, uma legião de mulheres negras que pensam o mundo, a economia, as cidades, os esportes, a saúde, a educação e que estão em outro patamar de afirmação política, muito além da visão de gabinete de pessoas brancas que não aceitam a reconfiguração de espaço e de poder frente às mudanças estruturais da sociedade, graças, em boa parte, às políticas públicas formuladas pelo governo.
Convenhamos, senhor Presidente, há uma série de fatos que mostram o quanto o setor progressista tem que evoluir e coexistir com outros campos. Coexistir com pessoas negras que são independentes da tutela e aprovação de pessoas brancas, indomesticáveis, e que ditam o mundo a partir de suas experiências em comum e luz própria. Senhor presidente, é isso que o futuro pede. Uma política de drogas totalmente diferente da que foi feita nos anos de superlotação carcerária, uma representatividade real aliada à consciência crítica no Judiciário brasileiro, uma reformulação do doctorvideos.net pensamento colonizado da elite progressista do país. A disputa além da branquitude de esquerda e de direita produz mudanças radicais na sociedade brasileira, mas se percebe uma grande dificuldade em entender isso de fato, materialmente.
Espero trocar outras cartas, Presidente Lula. Saiba que você está em meus pensamentos e que a injustiça que se passa na carceragem da Polícia Federal de Curitiba é percebida por milhões aqui fora, sem contar internacionalmente, onde sua prisão é tida como um dos grandes absurdos políticos em curso. Tenho ido bastante ao exterior, e explicar o que se tornou o Brasil tem sido um grande desafio aos olhos incrédulos de quem já viu o porte deste país, quando as pessoas tinham orgulho e eram respeitadas por serem brasileiras. Era no seu governo e no de Dilma essa realidade.
Fique bem, fique em paz. Peço a Oxalá que tranquilize seu caminho.
“Em conversa com o jornal Brasil de Fato, Cristiano Zanin reforçou a tese de perseguição política contra o ex-presidente”
Cristiano Zanin, advogado de defesa de Lula, durante julgamento de recurso no Tribunal Regional Federal da 4ª Região, em janeiro de 2018 / Foto: Sylvio Sirangelo/AFP
Nos últimos cinco anos, Cristiano Zanin Martins, advogado criminalista e membro da equipe de defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, tem tido pouco descanso. Ele e outros advogados e advogadas têm travado uma verdadeira batalha judicial para garantir que os direitos fundamentais do ex-mandatário sejam respeitados.
Lula está preso desde o dia 7 de abril em Curitiba, acusado pelo Ministério Público Federal (MPF) de haver recebido recursos ilícitos de uma empreiteira, através da reforma de um apartamento triplex na cidade de Guarujá, litoral paulista.
Lula não só nega a acusação, como afirma que é vítima de uma perseguição jurídica com fins políticos. Ao completar um ano de sua prisão, o Brasil de Fato conversou com Zanin para saber quais serão os próximos passos da defesa pela liberdade do ex-presidente. Confira:
Brasil de Fato: Já se passou quase um ano desde a decretação da prisão do ex-presidente pelo ex-juiz Sérgio Moro. Um ano que, apesar de todo o trabalho da defesa, o ex-presidente permaneceu preso e acabou impedido de participar das eleições presidenciais. Qual o balanço que a defesa faz de tudo o que aconteceu até agora?
Cristiano Zanin Martins: Lamentavelmente, tudo o que nós afirmamos no comunicado feito ao Comitê de Direitos Humanos da ONU em 2016, veio a ocorrer. Em julho de 2016, quando nós protocolamos aquele comunicado perante a ONU, nós já dissemos que o ex-presidente Lula estava sendo vítima de uma intensa perseguição, de uma verdadeira cruzada de alguns setores do sistema de Justiça brasileiro, e que o objetivo era condená-lo sem prova de culpa com o fim de inviabilizar, de impedir a sua atuação política e até mesmo uma eventual candidatura à Presidência da República em 2018.
Tudo isso veio a ser confirmado por um processo marcado por graves violações ao direito de defesa, às garantias fundamentais do ex-presidente Lula. Depois sobreveio uma sentença que claramente condenou o ex-presidente Lula sem nenhum elemento concreto, sem nenhuma base jurídica e que foi confirmada pela segunda instância. O ex-presidente não teve, até o momento, o direito a um processo justo, a um julgamento imparcial e independente, e isso, possivelmente, foi levado em consideração pela ONU nas decisões liminares que foram concedidas no ano passado para que o ex-presidente pudesse concorrer nas eleições presidenciais, quando ele inclusive liderava todas as pesquisas de opinião. Infelizmente, o Brasil, descumprindo uma obrigação internacional que havia assumido por meio de tratados, deixou de cumprir essas liminares que foram concedidas pelo Comitê de Direitos Humanos da ONU.
O que ocorreu na sequência, que é público e notório, foi que o juiz Sérgio Moro, que capitaneou todo o processo de condenação do ex-presidente Lula, veio se tornar o principal ministro de um governo eleito nessas circunstâncias, eleito a partir de um impedimento indevido da candidatura do ex-presidente Lula. Então, esse cenário, esse desfecho inclusive, da própria ida do ex-juiz Sérgio Moro ao governo federal, um governo de oposição ao ex-presidente, deixou claro para quem poderia ter alguma dúvida, de que Lula não teve jamais um julgamento imparcial e um julgamento justo. Nós esperamos que todo esse cenário possa levar o Comitê de Direitos Humanos da ONU a confirmar as violações grosseiras que nós afirmamos e que também haja sensibilidade das cortes superiores brasileiras para que venha a reverter essa condenação imposta ao ex-presidente Lula e restabelecer a sua liberdade plena o mais breve possível porque essa é a única situação compatível com a de uma pessoa que não praticou qualquer crime. E isso fica muito claro a partir de tudo o que aconteceu até hoje. Já são cinco anos de investigação intensa contra o ex-presidente Lula, contra os seus familiares e colaboradores e nenhuma prova de culpa foi apresentada, nenhum elemento concreto foi apresentado, a não ser insinuações, ilações que, como todos sabemos, não podem jamais fundamentar uma condenação criminal.
A defesa tem reiterado que o ex-presidente é vítima de lawfare. Gostaria que o senhor explicasse aos nossos ouvintes e leitores do que se trata e quais são as evidências dessa prática no caso do ex-presidente Lula?
A acusação que foi dirigida contra o ex-presidente Lula no caso do triplex, assim como outras acusações, têm em comum a absoluta falta de materialidade. Não há nenhuma evidência, não há nenhuma prova contra o ex-presidente Lula, mas isso não impediu que ele fosse condenado e essa decisão utilizada para mantê-lo preso há cerca de um ano. Então, essa situação, associada a uma clara intenção de perseguição política, nos leva a classificar esse caso como um caso emblemático de lawfare, que é justamente o uso perverso das leis e dos procedimentos jurídicos para fins de perseguição política.
A defesa também tem afirmado reiteradas vezes que durante todo o processo de instrução apresentou provas da inocência do ex-presidente Lula no caso do triplex do Guarujá. Quais provas foram essas? Em contraponto, o que a acusação apresentou?
A acusação não fez qualquer prova de culpa do ex-presidente Lula. A sentença condenatória, assim como a sua confirmação em segundo grau pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, deu-se fundamentalmente com base no depoimento de um corréu, em um depoimento prestado sem o compromisso com a verdade e por uma pessoa claramente interessada em obter benefícios do Ministério Público. Por outro lado, nós fizemos as provas, durante diversas audiências, após oitivas de 73 testemunhas, de que o ex-presidente Lula não praticou qualquer ato ilícito, não praticou nenhum ato de ofício, não recebeu qualquer contrapartida, ao contrário do que foi afirmado pela denúncia feita pelo Ministério Público. E fomos além. Nós demonstramos que aquele apartamento do Guarujá pertencia, ou pertence até hoje à OAS, e havia sido dado em garantia em uma operação feita entre a OAS e a Caixa Econômica Federal e, portanto, para que alguém recebesse a propriedade daquele apartamento teria, segundo aquele contrato feito entre a OAS e a Caixa, que pagar 100% do valor do apartamento à Caixa Econômica Federal. O que jamais aconteceu.
Então essa situação mostra o caráter frívolo da acusação que foi dirigida contra o ex-presidente Lula, mostra a absoluta falta de materialidade, mostra que o Ministério Público não fez qualquer prova de culpa do ex-presidente e mostra ainda que as provas de inocência que nós, advogados de defesa, fizemos, foram desprezadas tanto em primeira instância quanto na segunda instância. Nós temos recursos pendentes de julgamento nos tribunais superiores e entendemos que esses recursos devem levar à reversão da decisão condenatória porque essa decisão condenatória viola frontalmente a legislação federal e também a Constituição Federal.
Equipe de advogados de defesa do ex-presidente Lula. Foto: Miguel Schincariol/AFP
Como o senhor já mencionou nessa entrevista, além das duas instâncias superiores ainda há uma expectativa sobre o julgamento do mérito do caso do ex-presidente no Comitê de Direitos Humanos da ONU. Como vai esse processo?
Nós apresentamos esse comunicado individual ao Comitê de Direitos Humanos da ONU em 2016, fizemos diversas atualizações desse comunicado até o presente momento, tínhamos uma expectativa de que ele pudesse ser analisado no mês de março, quando ocorreu uma reunião do Comitê, mas tivemos conhecimento de que o Brasil acabou por apresentar uma nova manifestação no último dia 19 de março que pode ter inviabilizado essa análise.
Mas outras duas sessões do comitê irão acontecer ainda neste ano, possivelmente em julho e em novembro, e nós temos a expectativa de que o Comitê possa, em uma dessas duas sessões que ocorrerão neste ano, analisar esse comunicado porque é um comunicado já instruído, com todas as evidências de violações grosseiras às garantias fundamentais do ex-presidente Lula e que está, portanto, pronto para julgamento, e esse julgamento poderá reconhecer a ocorrência dessas grosseiras violações às garantias fundamentais do ex-presidente Lula e ajudar o Brasil a se reencontrar com o Estado de Direito, com a legalidade e, consequentemente, permitir o restabelecimento da liberdade plena do ex-presidente Lula porque ele não praticou qualquer crime.
Além dos recursos impetrados pela defesa em outras instâncias, também há um julgamento no STF que pode ter impacto sobre o caso do ex-presidente Lula e é o julgamento das ADCs que questionam o entendimento do Supremo sobre a prisão após condenação em segunda instância. O presidente do Supremo, Dias Toffoli, retirou esse julgamento da pauta, atendendo a um pedido da OAB, como o senhor avalia esse adiamento?
Nós da defesa do ex-presidente Lula não participamos diretamente dessas ações que tramitam no Supremo Tribunal Federal discutindo a questão da prisão em segunda instância. Mas, evidentemente, acompanhamos porque é um tema que tem total interesse da defesa e cujo desfecho pode ter bastante repercussão no caso do ex-presidente Lula.
A nossa visão é de que a Constituição Federal brasileira não permite outra interpretação que não seja a de impedir qualquer execução de pena sem a existência de uma decisão condenatória transitada em julgado. A Constituição é expressa nesse sentido, ao garantir, ao assegurar a presunção de inocência até que haja uma decisão definitiva transitada em julgado. E, por isso, nós entendemos também que seria muito importante que o Supremo possa reafirmar esse entendimento o quanto antes, possa restabelecer uma linha jurisprudencial que já era afirmada anteriormente por aquela corte, exatamente nesse sentido.
A interpretação dada em 2016 por maioria de votos, com todo respeito, não é compatível com a nossa Constituição. As pessoas podem ter opiniões, podem gostar ou não dessa leitura constitucional. Mas não e possível modificar o texto constitucional por uma interpretação que venha a se dar pelo Supremo Tribunal Federal em outro sentido. É preciso, efetivamente, garantir a inteireza do texto constitucional, e isso somente será possível se o Supremo Tribunal Federal reafirmar essa posição, a posição de que ninguém pode ser preso, ninguém pode ser obrigado a cumprir uma pena sem que haja uma decisão condenatória definitiva transitada em julgado.
Nós levamos ao processo que tramitou na 13ª Vara Federal Criminal de Curitiba provas de que houve cooperação informal de autoridades estadunidenses com autoridades brasileiras. Inclusive, naquilo que chamaram de construção do caso. É preciso ressaltar que o Brasil tem um acordo firmado com os Estados Unidos, prevendo uma série de formalidades para que haja uma cooperação entre os dois países. E no caso do ex-presidente Lula, nós mostramos que essas formalidades não foram observadas. A própria cooperação dos Estados Unidos é classificada como informal, o que não é possível. Cooperação informal é algo ilegal, é algo ilícito, é algo que não pode ser aceito no nosso país porque viola o tratado internacional que foi firmado com os Estados Unidos.