Representantes do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) e do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) resolveram reagir e classificaram o projeto de lei, que pretende equiparar suas ações a atos terroristas, como uma “aberração” e uma tentativa de intimidar e amordaçar os movimentos sociais no país. E prometeram que vão se mobilizar para impedir a aprovação da proposta do deputado Jerônimo Goergen (PP-RS), que torna suas ações, sob a perspectiva da lei, em atos terroristas. As informações são de Isabella Macedo, do Congresso em Foco.
O deputado gaúcho acaba de apresentar um projeto que, na prática, pretende incluir movimentos como o dos sem terra e o dos sem teto na legislação antiterrorista. A proposta, apresentada no último dia 7, modifica o artigo 2º da Lei 13.260/16, conhecida como Lei Antiterrorismo, sob a justificativa de que é preciso criminalizar “o abuso do direito de articulação” desses movimentos e “colocar um paradeiro no clima de guerrilha que, não raro, instala-se em nosso território”.
Para o diretor nacional do MST, Alexandre Conceição, o parlamentar da bancada ruralista tenta aprofundar a criminalização dos movimentos populares, intimidar e reprimir o MST e grupos semelhantes. Ele lembra que diversas entidades foram contrárias à aprovação da lei antiterrorismo e que o texto só foi convertido em lei depois que o Congresso introduziu um dispositivo para a proteção dos movimentos sociais.
Goergen pretende retomar o dispositivo excluído para permitir que os movimentos que lutam por terra e moradia possam ser enquadrados como terroristas. “Com a atual conjuntura e com a relação de forças, os golpistas se acham na obrigação de aprofundar ainda mais a criminalização. É um processo de aprofundar a criminalização dos movimentos sociais”, disse Conceição. “Isso não vai nos intimidar. O MST vai continuar ocupando terras para identificar que o latifúndio improdutivo tem de cumprir sua função social, e cumprir essa função é colocá-lo à disposição para a reforma agrária”, afirmou.
Já a coordenadora do MTST, Natália Szermeta, classifica o projeto como uma “aberração”. “Esse projeto é uma aberração, genérico, questionável do ponto de vista criminal ao não ser claro sobre o que consideraria crime”. Para ela, é lamentável que um deputado eleito pelo povo queira transformar movimentos sociais, que são fundamentais para o avanço de garantia de direitos no país e que historicamente lutam por isso, em terroristas. “Fica cada vez mais claro que temos no país representantes preocupados com o que não têm de se preocupar. Eles deviam estar preocupados em resolver os problemas da saúde, da educação, da moradia, da miséria e do desemprego. É com isso que os deputados deveriam estar preocupados, mas não, eles estão preocupados em combater os movimentos que lutam para melhorar o país”, disse a coordenadora do MTST.
Ela afirmou ainda que o MTST articulará com outros movimentos para construir uma estratégia de resistência para impedir que o projeto siga. “A gente vê como uma tentativa de criminalização da luta social e de organizações que historicamente foram fundamentais para a garantia de direitos no nosso país”.
Conceição afirma que a proposta tem como pano de fundo a tentativa de subordinar a agricultura brasileira ao capital internacional e de facilitar que empresas estrangeiras adquiram terras no país. “De um lado, entrega a soberania e, do outro, reprime os movimentos. Portanto, eles não têm nenhum compromisso com o povo brasileiro, com a alimentação do povo brasileiro e com a democracia”. O MST é o maior produtor de arroz orgânico da América Latina e, no ano passado, estimava-se que a organização exportava 30% de sua produção. “Nós queremos democratizar a terra para fazer a reforma agrária popular, para dividi-la, produzir alimentos saudáveis na agroecologia, distribuindo alimentos saudáveis com custos mais baratos na cidade”, explica Alexandre.
O diretor do MST afirma que a justificativa do projeto, de que é preciso criminalizar “o abuso do direito de articulação”, representa uma “lei da mordaça”. Segundo ele, o autor da proposta pretende coibir que os movimentos se reúnam para reivindicar a sua pauta histórica. “É um projeto que radicaliza muito a lei do terrorismo e que tenta nos intimidar, nos amordaçar, nos colocar no gueto. Mas isso não está nos intimidando”, disse Conceição, que afirmou que o MST ficará atento às movimentações desse e de projetos semelhantes.
“Como vai se descrever o que é ‘abuso do direito de articulação?’”, questiona Natália. “Ele tinha de estar mais preocupado em colocar um paradeiro no clima de roubalheira no país, na destruição de direitos e nas malas de dinheiro que aparecem. Ele tinha de estar preocupado em criar mecanismos para que o país se recuperasse”. Ela afirmou ainda o MTST também acompanhará as movimentações do projeto. “E não permitiremos mais este ataque à democracia”, conclui a coordenadora do movimento.
O artigo que Jerônimo Goergen pretende alterar define a interpretação do que é terrorismo e quais atos são enquadrados como tal, prevendo pena de 12 a 30 anos de reclusão, além das punições aplicadas à ameaça e à violência.
Ele disse que é preciso “colocar um limite” nas ações dos movimentos que lutam por terra e que organizações sociais agem como grupos terroristas e podem ameaçar vidas. O deputado citou um episódio em que o MST foi acusado de invadir e depredar uma fazenda. A invasão e a depredação citadas pelo deputado teriam acontecido no início de novembro do ano passado. O Movimento Brasil Livre (MBL) divulgou, no Facebook, imagens de um galpão incendiado e de destruição de parte das fazendas Igarashi e Curitiba, localizadas em Correntina, no interior da Bahia, afirmando que o movimento destruiu “fazenda produtiva, referência em tecnologia”.
O MST divulgou nota desmentindo a acusação do MBL, chamando-a de fake news e afirmando que apesar de as manchetes de veículos de comunicação apontarem o movimento como participante da ação, não houve envolvimento na mobilização.
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