Aviadando para construção de uma Pedagogia da Libertação assim como ensinou Paulo Freire!

Diante da proibição da exposição queer no Santander; diante da tentativa judicial de repatologização da homossexualidade no Distrito Federal; diante dos absurdos ditos pelo vereador Ronaldo Cancão na tribuna da Câmara Municipal de Petrolina, é cada vez mais urgentes posicionamentos que venham dos/as LGBTs. Com isso, aproveitando o aniversário do grande professor Paulo Freire, venho nesse curto artigo refletir sobre a Pedagogia do Oprimido e sua contribuição na promoção da libertação dos/as sujeitos/as LGBTs.

Em uma de suas ultimas entrevistas Freire, encantado com o Movimento dos Sem Terras (MST), fala da necessidade de por todos/as os/as oprimidos/as em marcha. Ressaltando assim a importância dos novos movimentos sociais, e, com isso, nos apontando para a necessidade de constituição da marcha daqueles/as que querem amar e são impedidos. Sem fazer referência direta à sigla LGBT ele nos reconhece oprimidos/as pela lógica de desumanização instaurada por essa sociedade capitalista.

Segundo o nosso educador só os/as oprimidos/as são capazes de produzir a pedagogia de sua libertação, no entanto é necessário reconhecer-se enquanto oprimido/a. Precisamos então, no momento do contato com o outro(opressor), desestabilizar os nossos sistemas de verdades exógenos, que dizem sobre nós, mas não por nós. Assim podemos construir relações sociais que não se orientem por posturas eugênicas, que não busque a homogeneização dos indivíduos, não suprimindo físico e simbolicamente as diversidades de formas de ser no mundo. Não almejando assim um suposto modo melhor de ser, contribuindo para o exercício da vocação humana de ser mais, e com isso melhor/ando no mundo. Ser mais na descoberta da particularidade da sua existência, assim como nos ensinou Paulo Freire.

As identidades são lugares em movimento, em disputa, que se re/faz na/pela representação. Nesse sentido é que precisamos fazer o movimento em direção à humanização dos sujeitos gays, erigindo identidades que emanam desses corpos de formaautônomas, livres das violências disciplinares instituídas pelas identidades que se fizeram centros hegemônicos e reguladores. Ao fazermos isso acabamos por humanizar também os não gays, pois estes são desafiados a se repensarem humanos.

O movimento LGBT se insere naquilo que Paulo Freire chamou de busca da vocação humana. Haja vista que, o ser deve forjar-se na ruptura do parecer, pois parecer é parecer com o opressor. Na busca do ser mais, nossa verdadeira vocação humana, nos fazemos humanos. Pois tal vocação só pode ser exercida no exercício de humanização do outro, ser sendo com o outro. Aviadar-seé então nos permitir aprender na desestabilização das identidades, isso que se faz nas disputas politica de representação.

O grande problema está em como poderão os oprimidos, que “hospedam” o opressor em si, participar da elaboração, como seres duplos, inautênticos, da pedagogia de sua libertação. Somente na medida em que se descubram o “hospedeiro” do opressor poderão contribuir para o partejamento de sua pedagogia libertadora (FREIRE, 2011).

Assim sendo, o aviadamento pressupõe o rompimento com os modos corretos de ser. Extirpando assim o complexo da opressão, provocando a descoberta do hospedeiro que faz com que o oprimido pareça ser o que não si é, ser não sendo.

Segundo essa perspectiva, por meio de atos de violência, os sujeitos gays podem ser coagidos a não existir enquanto possibilidade no mundo, limitando-se a parecer ser hétero. Uma espécie de interdição dos espíritos, do ser, do corpo, do pensamento. A verdadeira vocação humana, o ser mais, é impossibilitada de se realizar devido à naturalização dos lugares e não lugares identitários que nos colonizam com sentimento de ser menos, de ser defeituoso, de ser patológico. E, com isso, vivemos uma hierarquização dos/as diferentes sujeitos/as.

Esses processos hierarquizadores se manifestam de diferentes formas, atingem os/as diferentes sujeitos/asc om potência de violência também diferente. A bicha pão com ovo, a biba, a pocpoc, a pintosa, a afetada, são as que mais sofrem com as agressões que se instituem por meio da hierarquização social. Seus corpos carregam inscrições de feminilidades não aceitas pelas normas morais machistas vigentes, e assim são submetidos aos processos disciplinadores que se fazem sobre a égide de muita violência.

 

FREIRE. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2011.

 

Por Antonio Carvalho (Mestre em Educação)